"algo hoje se abre. começa a suavizar/
brecha pro que não cabe /que não se sabe /fazer-se ar"
Escrevi com o batom quebrado no papel seda, quase molhado. Foi ler o que acabava de borrar úmido ali e correr em tropeços pr'aquele cômodo apertado, meu coração.
- não repare, é meu coração.
- sim, sou você. é meu também.
Caí na entrada, mas me dei a mão e levantei, quase rápido. Abrimos a porta que rangeu e resistiu de início, mas orgulhosa, tentou evitar que eu percebesse soltando-se logo depois. E o fresco jorrou. Verde, azul, vermelho, liquidamente sopro, em todas as direções e vindo de cada fresta. Toda a estrutura estremeceu estaticamente, como reverbe de grave por dentro. Harmônico, ácido e ainda assim sutil, um doído cicatrização que arde em cura.
- tá tudo bem. calma, é só cor. isso.
Deitei o rosto sobre o meu e senti o contorno gelado. Mas gelado gostoso, como um que não carrega os tons de cinza da palavra 'gelado'. Gelado como travesseiro quando o viramos e o verso se oferece lírico, acalento, sabe? Olhei em torno: fotos, tantos bilhetes, e cartões, e pequenos presentes, e papéis dobrados. Marcados. Cravados na pele, na parede memória, transbordando as primeiras gavetas. As primeiras! Expostos, como a fratura. Bem à vista do esquecimento.
- é pra que ele não se seja.
- psshh! eu sei.
E sabia. Mas, não sei... não queria.
E ele lá(o fresco), restaurando a mobília. Tão dentro que um sempre, um todo.
E era aquilo. Empilhei meus livros mais altivos, e tudo que estava nas paredes partilhadas partidas, mal resolvidas. Sobre aquelas 2 vidas de altura da torre que ergui, um frágil e sincero equilíbrio precário. Ok. Respirei fundo, estiquei os braços, as mãos, o corpo, os dedos do pé em ponta, até a franja de uma das nuvens de meio de céu que por ali estava e que eu já quase tocava. Toquei. Me pendurei e subi. Pude me ver indo, e indo. Indo até sumir ao longe.
Acenei pra mim, dali mesmo. Mas não olhei pra trás, não vi o aceno, talvez tenha-o sentido brisa, uma que na hora passava e resolveu me dar moldura.
De repente, outro dia ainda no mesmo. Acordei Nutella. Não, gaivota de papel.
Talvez seja mais um espreguiçar. Isso, acordei um espreguiçar
- que é quando a gente é ontem por 3 minutos, mas como quem se aprende e se esforça pra lembrar, logo depois se rasga em hoje.
sexta-feira, março 14, 2008
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Um comentário:
de repente, outro dia ainda no mesmo...adorei isso!
beijo querido
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